Draft Brasil entrevista Ruben Magnano
O ano de 2009 é especial para o Draft Brasil, por conta de seus 5 anos de existência. O dia 28 de agosto de 2009, entretanto, é uma data muito marcante para o basquete sulamericano, pois é a data em que se comemora o ouro olímpico conquistado pela seleção da Argentina.
Há exatos 5 anos, a Argentina corrigiu a injustiça que lhe tirou o lugar mais alto do pódio no Mundial de 2002. Nas Olimpíadas de Atenas, o ouro veio acompanhado de juros e correção monetária, com direito a uma surra implacável sobre os EUA e um verdadeiro passeio na final, contra a seleção italiana.
E se é verdade que aquela geração argentina é/foi formada por jogadores especialmente talentosos, não se pode tirar o crédito de quem comandou com maestria aquela equipe: o treinador Ruben Magnano, condutor da geração dourada.
O currículo de Magnano fala por si só: dirigindo o Atenas de Córdoba, é Tetracampeão argentino e Tetracampeão sul-americano. Pela seleção da Argentina, nos 3 anos em que ficou à frente do time adulto, foi: Campeão Sul-Americano (2001); Campeão da Copa América (2001); Vice-campeão Mundial (2002); Vice-campeão da Copa América (2003) e, finalmente, Campeão Olímpico (2004).
Por telefone, Ruben Magnano bateu um longo bate-papo de cerca de 20 minutos com o Draft Brasil, em que abordou diversos assuntos como a geração dourada, liga argentina, a seleção atual de seu país, seleção brasileira e muito mais.
Draft Brasil: Antes de mais nada, gostaria de dizer que é uma grande honra falar com o senhor. Nós do Draft Brasil temos um grande respeito pelo senhor, pelo seu trabalho à frente da seleção argentina, assim como todos os brasileiros amantes do basquete também tem esse respeito.
Draft Brasil: Sr. Magnano, como foi acordar no dia 29 de Agosto de 2004, um dia depois da conquista do ouro olímpico?
Ruben Magnano: Eu penso que o grande sentimento que se pode sentir é um grande orgulho de pertencer a uma seleção, argentina neste caso, e ter ganhado uma medalha de ouro, nada mais, nada menos do que nos Jogos Olímpicos, mas também há uma sensação de que você não se dá conta da magnitude do que acabou de conseguir. Talvez por ainda seguir na carreira, continuar treinando outras equipes, talvez ainda não tenha me dado conta do que foi feito.
Draft Brasil: É possível dizer que houve uma data que marcou o início dessa era vitoriosa no basquete argentino? Caso positivo, quando foi?
Ruben Magnano: Pessoalmente, acredito que a Argentina sempre jogou um bom basquete, assim, esse grupo de jogadores que venceu os Jogos Olímpicos pode ter sido favorecida, no meu modo de ver, por uma série de elementos, em que a seleção pôde aproveitar para ter uma performance como a que teve e como a que tem, como fundamentalmente a criação da nossa Liga Nacional, para melhorar nossa qualidade. Outra coisa muito importante foi que muitos jogadores conseguirem tirar seus passaportes comunitários, principalmente para viajar e jogar em equipes importantes da Europa. Isso os levou a crescer como jogadores, e esse crescimento depois foi levado, através deles, para a seleção argentina.
Draft Brasil: E na final do mundial de 2002 (contra a Sérvia), quando sua equipe foi prejudicada pelos árbitros. A Argentina merecia ter ganhado aquele mundial. Ainda lamenta o que ocorreu naquela partida?
Ruben Magnano: Não, não. Infelizmente não pudemos ficar com o título deste mundial, na competição que eu acho que a Argentina jogou o melhor basquete deste grupo de jogadores, melhor, como equipe, como basquete, do que nos Jogos Olímpicos, inclusive. Mas, infelizmente, não ganhamos o ouro em Indianápolis, mas acho que isto serviu para alimentar a nossa vontade de buscar o ouro nos Jogos Olímpicos. Nosso comprometimento com a vitória foi duas vezes maior. Nossa sede de vitória foi duas vezes maior. E foi essa derrota para a Iugoslávia que nos alimentou com tudo isto que estou dizendo agora.
Draft Brasil: Falando nisso, dois anos depois, o destino se encarregou de colocar mais uma vez a Iugoslávia e Argentina frente a frente. Que importância teve essa partida para a conquista do título?
Ruben Magnano: Podem haver dois pontos de vista para isso. Um fato numérico, meramente numérico, pois era apenas mais uma partida que importava para a continuação do torneio, assim como também perdemos para a Espanha e isso não nos tirou a oportunidade de terminar com o título. Mas sim, por outro lado, creio que foi importante, no aspecto de ânimo, pelo rival que enfrentamos em 2002, o mesmo. E não é menor o como se ganhou, aquele tiro do Ginóbili. Talvez uma sorte e uma premonição do que ia ser esse torneio.
Veja o vídeo com o lance abaixo:
Draft Brasil: E quando o senhor se deu conta de que aquela equipe seria campeã olímpica?
Ruben Magnano: Pessoalmente, como chefe de uma comissão técnica, eu sempre alimento a esperança, o trabalho, a confiança para as partidas que estão por vir, tenho que dizer que nós havíamos declarado antes de ir ao torneio, que a Argentina ia para disputar medalha na competição. Não sabíamos qual cor, mas íamos para lutar por medalha. Esse sonho existia, faltava passá-lo em forma de atitude para dentro de quadra, e creio que fizemos isso de uma boa maneira. Carregávamos todos os dias esse sonho de saber que podíamos ganhar a medalha.
Draft Brasil: Com a saída de Montechia e de Pepe Sanchez, a seleção argentina não conseguiu jogar mais no mesmo nível. Ainda assim, Prigioni se encarregou de manter a Argentina nas primeiras colocações dos torneios internacionais. O senhor poderia falar um pouco a respeito desses jogadores?
Ruben Magnano: Bem,eles estiveram com a responsabilidade desta posição durante o período em que dirigi a seleção. Tiveram a responsabilidade de liderar a armação da equipe, a parte técnica, os dois com características diferentes, mas ambos sempre cumpriram com êxito os momentos que foram chamados para jogar, sendo de importância vital em cada um do torneio que ambos disputaram. Agora, por sorte, Prigioni voltou à seleção, que penso ser o melhor armador que temos, penso não, é o melhor, está jogando na Europa, sendo disputado pelas principais equipes de lá. E temos os jovens, ainda em formação. Que eles possam adquirir uma boa experiência agora em Porto Rico…
Draft Brasil: Depois do ouro em Atenas, o senhor foi trabalhar na Italia, mas não conseguiu repetir o mesmo sucesso no seu trabalho. Quais foram as maiores dificuldades encontradas?
Ruben Magnano: É preciso ter um pouco de cuidado com isso. Eu não fui trabalhar no Benneton, Siena ou Milano, fui trabalhar em uma equipe de porte médio, com ambições simples, onde as contratações eram limitadas (Magnano dirigiu o Varese, de 2005 a 2007). Acho que com a situação que existia, com o objetivo que tínhamos como proposto. Ser campeão não é a única maneira de se ter uma boa campanha. Isso depende da equipe que dirige. Estou muito contente com o trabalho que fiz com minha comissão técnica no Varese. Não foi o caso de me levarem a uma equipe que obrigatoriamente estaria entre os quatro primeiros e eu teria que conquistar o campeonato. Então estou bem contente com o que fizemos. Na Espanha, em Sevilla, não foi bem assim. Há elementos que creio que influenciam, como fundamentalmente conhecer onde se jogará para montar uma equipe. Não basta simplesmente contratar bons jogadores. Há que se ter um conhecimento amplo do basquete europeu, com todas as variáveis que possui. Também o conhecimento do basquete do país que está trabalhando, não só de jogadores, mas de arbitragem, da forma de jogar, todas essas coisas influenciam. Bem, para mim foi um aprendizado que eu valorizo muito.
Draft Brasil: Bem, e na Argentina mais uma vez campeão (com o Atenas, que venceu o Peñarol na final da liga nacional). O que representa para a Liga argentina ter uma final com os dois treinadores medalhista olímpicos (Sergio Hernandez, técnico da seleção na conquista do Bronze em Pequim, dirigiu o Peñarol), além de alguns atletas que fizeram parte dessas seleções, como Leo Gutierrez e Roman Gonzales?
Ruben Magnano: O que significa é a concretização da nossa competência, que nós, direta ou indiretamente, estamos buscando. Tudo o que aprendemos, conceituado, lemos, vimos, escutamos ao longo de todos esses anos, buscando o melhor para nossas equipes e para a nossa liga nacional.
Draft Brasil: Me parece que Sergio Hernandez não é uma unanimidade entre os argentinos. O que o senhor pensa do trabalho dele a frente da seleção argentina até agora?
Ruben Magnano: Veja, o trabalho nas seleções se avalia, nem sempre é assim, mas geralmente sim, se avalia pelo grau dos resultados que conquista, e creio que Sergio já conseguiu conquistar um pouco dos objetivos que se propôs, soube muito bem levar e manter a seleção nacional no primeiro escalão do basquete internacional, e isso não é pouca coisa.
Draft Brasil: Enquanto o basquete argentino cresceu, o brasileiro seguiu um caminho contrário. Existem muitas tentativas de respostas para as nossas derrotas por aqui. O senhor tem alguma opinião a respeito do que pode ter acontecido para a Argentina nos deixar tão pra trás no basquete em tão pouco tempo?
Ruben Magnano: Eu acho que talvez por algumas variáveis, como disse anteriormente, mas penso que o Brasil, e isso é uma visão pessoal pelo tempo que passei trabalhando com a seleção argentina, enfrentando seleções brasileiras em todas categorias do basquete, cadete, juvenil, sub21, adulto, ou mesmo contra clubes brasileiros muitas vezes, penso que o Brasil tem uma qualidade impressionante nos seus jogadores…talvez possa dizer que a melhor qualidade, depois dos EUA, em quantidade de jogadores. Não estou envolvido com o que acontece no basquete brasileiro, mas talvez possa existir um problema de organização e isso é algo que considero vital para qualquer seleção, além do grau de comprometimento que os atletas têm com sua seleção.
Draft Brasil: O senhor pensa em trabalhar em alguma equipe brasileira? Já recebeu alguma proposta?
Ruben Magnano: Não, não. Não tive nenhuma proposta de trabalho. Algumas vezes, alguns treinadores com quem converso por telefone ou algo do tipo, conversas sobre basquete, mas nenhuma proposta de equipe ou algo do tipo.
Draft Brasil: E para finalizar, qual o jogador mais completo com quem já trabalhou?
Ruben Magnano: Que eu trabalhei… Penso que, Ginóbili. Ainda que não tenha tido a oportunidade de trabalhar uma temporada completa com ele, somente trabalho de seleção. Ginóbili e Scola são jogadores muito….bem, não seria certo dizer um só nome porque cada um tem sua própria posição, mas eu tive a sorte de treinar grandes jogadores… Campana, Milanesio, Oberto… jogadores que seriam merecidamente colocados nesta posição de melhor, mas talvez, se tiver que dizer um que se destaca um pouco além, esse seria Ginóbili.
Entrevista realizada por Alfredo Lauria com a colaboração imprescindível de Guilherme de Paula e Diego Silvestrini.