A melhor escola de basquete do nosso século
por Beto Jannarelli
Antes de contar de forma resumida a história da melhor escola de basquete do nosso século, agradeço ao Felipe Mellini pelo convite para colaborar neste espaço que tanto admiro. Espero contribuir para a continuação do site e aumentar o diálogo sobre basquete no nosso país.
Meu relato se inicia na temporada 98-99 da NBA, a primeira após a saída definitiva de Michael Jordan do Chicago Bulls, isto é, a primeira em que os outros times teriam a chance de disputar, de fato, o título da liga. Foi também o ano do último loucaute antes do que ocorreu esse ano e atrasou o início dos jogos.
O título daquele ano foi para o San Antonio Spurs, time do técnico Greg Popovich e do almirante David Robinson, que se aposentaria alguns anos depois como um dos poucos franchise players contemporâneos a MJ que conquistaram dois anéis de campeão.
O time contava com outro veterano, o ala Sean Elliot, um dos melhores small fowards da década de 90, uma dupla de armadores contestada, o arremessador Mario Elie e o aguerrido Avery Johnson (técnico do ano de 2005-06), e um jovem ala-pivô nascido nas Ilhas Virgens que fora draftado um ano antes e caminhava a passos largos para assumir o posto de cestinha, reboteiro, capitão e principal nome da história da franquia: Tim Duncan.
O time jogava um basquete muito consistente, com uma ótima defesa e um ataque que rodava a bola até encontrar uma das torres gêmeas para finalizar no poste alto com um arremesso equilibrado, ou no poste baixo com Duncan. Não havia marcador que o parasse no post-up naquele ano. Caso a defesa conseguisse impedir o passe para as torres, cabia ao jogador mais adequado do perímetro finalizar, aproveitando do desequilíbrio gerado na dobra em um dos pivôs. Um basquete simples, muito bem-executado, mas que não empolgava, em geral, os torcedores.
A frustração na luta pelo bi-campeonato começou com a superação de um grave problema de saúde para Elliot e terminou com o título dos Lakers, time em que Phil Jackson reeditava o sistema dos triângulos, desta vez com os vértices O’Neal e Bryant. O trio dominou a liga por mais dois anos, tempo para os Spurs remodelarem seu elenco e começarem a montar um novo time, mas com a mesma filosofia. Duncan acumulara sua função e a de Robinson, que se tornara um coadjuvante de luxo, aliados aos defensores implacáveis Stephen Jackson e Bruce Bowen, bons arremessadores do perímetro, como Steves, Smith e Kerr, e outros veteranos para auxiliar no desenvolvimento de uma dupla de jovens e promissores estrangeiros: Tony Parker e Manu Ginobilli.
Com esta base, os Spurs voltaram a vencer a liga em 2003. Um time que abusava do pick n´roll com Parker/Ginobilli-Duncan e assim decidia a maioria dos jogos importantes. Defesa forte com muitas variações, alto número de passes trocados no ataque até a seleção do melhor arremesso e uma transição veloz em um time de alto QI de jogo eram as principais características do elenco que misturava o melhor basquete europeu com o melhor da NBA. Um timaço! Mas, mesmo assim, que não empolgava. Os torcedores ainda preferiam o individualismo dos Bryants, Carters e McGradys.
Em 2004 o bi-campeonato não veio, mais uma vez por causa dos Lakers. Em uma semi-final de conferência que entrou para a história da NBA, Derek Fischer acertou um improvável arremesso a 0.4 segs do fim do jogo 3, roubou o mando de quadra para Los Angeles, que eliminaram os Spurs em seguida. Mais uma vez o bi-campeonato não veio. Mais uma vez o time não empolgava os torcedores.
No ano seguinte, com sistema e elenco bem parecidos com o de 2004, o título veio com uma série memorável contra os campeões Detroit Pistons e sua forte defesa. Não me lembro de uma final com duas defesas tão consistentes durante sete jogos quanto a de 2005.
É válido lembrar que Ginobili era o melhor jogador do mundo FIBA na época, mas nem assim era titular em San Antonio, prova da força do elenco texano. Bowen se tornou o defensor mais temido do basquete e, também nesse ínterim, Tony Parker deixava de ser uma promessa para se tornar um dos maiores armadores da liga.
Com o título, San Antonio chegava ao 3º campeonato desde o início deste recorte temporal, empatado com os Lakers, que venceram 3 títulos com a tríade Jackson, O’Neal e Bryant. Em títulos, empatados, mas em carisma, vitória fácil para L.A. Em basquete sólido, vitórias somando todas as temporadas regulares, ponto para o pessoal do Texas. Lakers era a franquia de Kobe Bryant e seu ego; Spurs era a escola de basquete de Greg Popovich. Uma franquia de sucesso incontestável. Mas, ainda assim, não empolgava.
A história segue em clima de dejà vu: os Spurs não conseguem ser campeões em temporadas consecutivas, em 2006 perderam na semi-final de conferência para o rival Dallas, mas em seguida volta a vencer a NBA. Em 2008, novamente campeões com basquete sólido, novamente Duncan decisivo, Ginobilli desequilibrando, Bowen defendendo muito e Parker, MVP das finais, mandando no time. E o time seguiu com a sina de vencer sem empolgar.
A mudança mais marcante da escola do técnico Popovich talvez tenha sido esta: de 2007 para cá o time foi se ajustando de modo a que Tim Duncan, veterano, deixasse de ser o cestinha, a referência no ataque. Hoje, o velho não Tim já não tem mais a mesma força física que o garoto do final da década de 90. Cada vez mais Spurs é o time de Tony Parker e talvez isso tenha pesado para uma equipe que joga há tanto tempo junto, e no mesmo sistema. Bowen já não está lá para marcar e Ginobilli se juntou a Duncan no time dos ex-craques que já não dominam a liga. A velocidade que lhes restou foi apenas a de raciocínio.
Com o bi-campeonato dos Lakers em 2010 e 2011, o placar no duelo dos times opostos está 5 a 4 para L.A. O empate pode vir este ano. Como San Antonio irá jogar todos sabemos, e o discurso dos torcedores rivais também: dirão que o time não os empolga. Eu respondo que o azar é deles.
Hoje os coroas dos Spurs vão a Oklahoma enfrentar os talentosos meninos do Thunder para os jogos 3 e 4 da final do Oeste. E como já estão vencendo por 2 a 0, uma vitória fora de casa encaminha mais uma final da NBA. E chegando lá, você duvida que eles possam ganhar? Eu não.