De olhos fechados para a realidade
Caros leitores, o Draft Brasil não cobriu o Mundial Feminino de Basquetebol, encerrado domingo com vitória dos Estados Unidos sobre a República Tcheca, estas donas-da-casa, mas não fechou os olhos para nossa campanha. Bert já analisou com profundidade e Guilherme Tadeu deu seu pitaco, ainda assim, achava necessário escrever um pouco mais sobre o que se passou no Mundial e as declarações surpreendentes que vieram depois.
Quando foi anunciado o nome de Carlos Colinas para a seleção feminina, muito pouco se sabia sobre o treinador espanhol. Ficou claro porém, que a diretora do basquetebol feminino conseguiu algum treinador no planeta que bancasse Iziane “A estrela (??)”, algo que Paulo Bassul, não faria sem um pedido de desculpas. Muito foi dito no momento da defenestração de Bassul e da contratação do ibérico.
O tempo passou e o Brasil reuniu suas atletas por três meses para treinamentos visando o Mundial. Até aí sem maiores problemas que pesassem as ausências de Erika e Iziane, que jogavam pelo Atlanta Dream na WNBA. Com um quarto do ano treinando, tempo que pouquíssimas seleções tem disponível, com a volta de algumas veteranas e a convocação, enfim, de algumas poucas revelações do basquetebol nacional, um pingo de esperança era sentido. Porém, com o azar de algumas contusões e o corte de outras jovens, chegamos ao Mundial com uma média de idade elevada e apenas Damires e Franciele como esperanças para o futuro próximo.
Nos amistosos preparatórios, a derrota para o Japão assustou. Mais do que isso, o nível da equipe deixava a desejar e começava a preocupar para o torneio. Na estréia contra a Coréia, um jogo de qualidade péssima. Dos piores que já assisti. Erros de fundamentos bizonhos em quadra, um time taticamente fálido, em suma, algo para se esquecer. No segundo jogo, Mali. Vencemos por sete pontos o azarão africano. Contando com Helen inspirada nos chutes de três pontos. Terceira partida, contra a Espanha, um chocolate que se desenhava (18 desperdícios de posse no primeiro tempo) foi adiado após pane das européias no último período. Mesmo assim, nova derrota.
Classificado para a segunda-fase, uma vez que três em um grupo de quatro passaram, o Brasil levou nenhuma vitória para a segunda fase (o resultado contra Mali foi descartado) e nos restavam vencer Rússia, Japão e República Tcheca. Perdemos da Rússia, como esperado. Contra o Japão, com uma bola de três pontos de Sylvia no final do tempo regulamentar e uma bola de três de Iziane para virar na prorrogação, vencemos por dois pontos o time asiático. Atuação novamente lamentável, como todas até então. Contra República Tcheca, mais uma vez um jogo para esquecer e mais uma derrota, dessa vez, sem conseguir se impor em momento algum do jogo. A partir daí, as vitórias contra Canadá e novamente Japão, nos colocaram no nono lugar do torneio.
A análise inicial do Mundial, que deveria ter sido feita de dentro da CBB, para acalmar os ânimos de todos que acompanharam o torneio e não acreditavam no que assistiam, foi de péssima qualidade. Cada dia que passa mais circense, a Confederação não conseguiu enxergar a realidade. Com Hortência fazendo declarações infelizes para quem quiser ouvir/ler (ao blog do Fábio Ballasiano, Fabio Sormani e Bert, novamente) e o Presidente Carlos Nunes demonstrando ter chegado de uma viagem à Lua, ficou mais do que claro que o barco do feminino está totalmente a deriva.
Fica claro, no final de toda esta novela, que a entidade não faz a menor idéia do que está fazendo com o basquetebol feminino e de como trabalhar, não somente para o futuro mas também para os torneios do presente. Fica ainda mais claro, que se isso que apresentamos no Mundial é o nosso melhor basquetebol, construído pelas nossas potenciais melhores atletas, podemos começar a nos preocupar seriamente para os próximos compromissos, que tendem a ser ainda mais deploravéis..
É dificil saber quais foram os principais erros da seleção. Porém o mix, técnico sem experiência necessária, atletas sem técnica, seleção mal organizada em quadra, desorientação fora de quadra, falta de liderança evidente, desculpas esfarrapadas e análises totalmente insensatas, fizeram este nono lugar e afundaram a modalidade. O baixo nível técnico do torneio, demonstra que a posição do Brasil é um desastre absoluto.
Resta analisar o que existe de fato, o que é muito pouco. O basquetebol feminino no país é jogado em São Paulo. Temos um estado da Federação atuante e alguns outros clubes que se esforçam. O nível praticado é pífio. A modalidade está longe do acesso de todos, as federações (para que ainda existem ?) não se movem e a Conferação mal consegue organizar um torneio nacional. Com poucas praticantes, poucos clubes, o que temos é quase nenhuma renovação. Enquanto a nossa geração campeã do Mundo jogava em um nível jamais visto por nós, nada foi feito para que o basquetebol feminino fosse uma opção real de esporte para as meninas (o que não causa nenhum espanto no Brasil, assistindo de longe o mesmo fenômeno no tênis, ginástica artística, automobilismo, etc).
Tão ruim quanto a renovação inexistente são as declarações de quem deveria ser a mais lúcida neste momento crítico. Hortência, diretora da CBB, se saiu com uma recente, porém já clássica declaração:
“Por várias vezes ligamos para a psicóloga no Brasil para ver o que poderíamos fazer. Elas lidaram muito mal com a derrota, o técnico se perdeu. Quando começaram a engrenar, já era tarde. Um dia, fiquei às 3h da manhã procurando uma música para um vídeo motivacional que ia passar para as meninas. Não acho que tem necessidade de levar um profissional de psicologia e vou continuar não levando”.
O Presidente da CBB, Carlos Nunes, se junta ao coro da irresponsabilidade ao declarar:
“O Mundial poderia ter sido melhor. Mas é o que eu sempre digo: os detalhes entraram em quadra. Não tem nenhuma modificação maior a fazer. Vamos agilizar para ter as respostas dentro da quadra já nas próximas competições. Sobre o técnico Carlos Colinas, esta é uma questão da área técnica, mas não vejo razão para não dar continuidade ao trabalho”.
Será que estas pessoas acham que estão tratando com bestas do outro lado ? Mais, será que acreditam que os torcedores, a imprensa, os amantes do basquetebol são tão burros ao ponto de achar que tudo é um mar de rosas e que o nono lugar, conseguido da forma que foi, é um resultado que podemos achar normal?
É irritante perceber que quem comanda o basquetebol feminino no país não tem a sensibilidade, a responsabilidade nem a auto-crítica de saber que fez bobagem desde a saída de Bassul, passando pela contratação do desconhecido Colinas e as atuações lamentáveis no Mundial e terminando com as infelizes avaliações sobre o ocorrido.
Hortência brada aos quatro cantos que:
“Conseguimos unir todo o grupo. A Iziane, que era uma preocupação de todo mundo, foi maravilhosa. Não a conhecia, mas ela é uma menina doce.”
Cara Hortência, não queremos a doçura da Iziane, queremos o basquetebol que a mesma esqueceu em algum lugar bem distante da República Tcheca. O que dizer da nossa auto proclamada “estrela”, da pivô de toda a demissão de um técnico gabaritado, que não consegue acertar arremessos nem bandejas? O que dizer da atleta que é completamente egoísta em quadra, algo que deixou bem claro em suas declarações pós-atrito com Bassul, que continuaria ser e foi. Como acreditar que a “doçura” de Iziane pode se sobrepor ao seu basquetebol pífio apresentado neste Mundial? E como acreditar que somente este extra-quadra rídiculo concede poderes para a atleta voltar à Seleção como se nada tivesse acontecido?
Mais do que nunca, Hortência possivelmente pode ser apelidade de “Oscar de Saias” pela quantidade de bobagens que tem dito e pela empáfia vista em seus comentários. Ainda assim, temos Janeth como projeto principal da diretora para ser treinadora da Seleção nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. A ex-atleta, excepcional em sua carreira, das melhores que tivemos no país, será lançada como treinadora da Seleção após este “estágio” para ganhar experiência. Bem, não seria melhor Janeth ir treinar no dia-a-dia em algum clube? Essa é uma primeira questão de várias que podem ser feitas.
Mais alarmante do que a preparação de Janeth para ser técnica de Seleção, foi a seguinte passagem. Sormani a questionou (relato no blog do jornalista) quando teríamos a reunião para resolver a questão do técnico Colinas, a resposta da diretora: “Não sei”. Em que planeta isso ocorre ? Em, qual empresa, instituição, ou qualquer outro local o descaso é tão grande e a organização é tão pequena ? O treinador apresenta este trabalho digno das piores notas e não temos data, não sabemos quando, não temos nem previsão de uma reunião entre a diretora da CBB e o presidente da instuição para analisar a situação do empregado. E Hortência ainda diz que “existe projeto”. Será que o “projeto” também não tem prazos, metas e ojetivos claros?
Seguimos da nossa trincheira boquiabertos com o que ocorre no basquetebol feminino. Seguimos incrédulos com a falta do minímo, do elementar, do básico, do essencial, que é análise profunda e verdadeira da nossa realidade por quem comanda o basquetebol. Além da análise, atitudes e práticas que sejam reais e não fiquem apenas no discurso sem nexo que estamos, infelizmente, tão acostumados.
E deixo no final, as palavras da espetacular Paula:
– “Para ficar em nono, talvez fosse melhor ter apostado na renovação.”
-“Iziane não é nenhuma Hortência, que decida jogo ou faça quarenta, cinquenta pontos. Iziane é uma jogadora mediana.”
E o texto do psícologo João Ricardo Cozac: Hortência: de rainha a sapo.