Entrevista exclusiva: José Luis Sáez, presidente da Federação Espanhola de Basquete
Se é verdade que o entrevistado não dispensa apresentações, é também verdade que ele hoje ocupa um dos cargos mais bem sucedidos do mundo dos esportes. Seguindo as atrações que comemoram nosso sexto aniversário (de fórum e quinto de site), falamos com exclusividade com o presidente da Federação Espanhola de Basquete.José Luis Sáez foi reeleito em 11 de novembro de 2008 de maneira unânime (110 delegados na Assembléia – primeira vez na história da entidade). Nos últimos dias, Sáez voltou ao noticiário ao liderar a Espanha na conquista do direito de sediar o Mundial de 2014 em casa. O máximo comandante do basquete espanhol falou da história do basquete de lá, além do projeto de desenvolvimento que conduziu o país a ser potência hoje em dia. Por fim, mostrou-se aberto ao intercâmbio com o Brasil. A entrevista na íntegra você confere abaixo:
Houve nesse ano, no Brasil, uma nova tentativa de criar uma liga de clubes, independente da Confederação. Qual foi a importância da ACB para o crescimento do basquete espanhol?
A ACB nasceu faz mais de 25 anos, em um contexto totalmente diferente do atual. Naquele momento, justamente em que se estava em questão toda a estrutura do esporte na Espanha, o impulso que a ACB deu foi muito importante. Mas nem então e nem agora a ACB é independente da Federação. Sua gestão é, mas sempre formando parte da estrutura do basquete espanhol, através da Federação.
Quais são as fontes de receita da FEB? Enfim, quanto custa o projeto espanhol de basquete, em média, por ano?
A receita do que foi batizado como “Método FEB” é tripla: profissionalismo, eficácia e ambição. São os três elementos que nos estão fazendo crescer, inclusive nesses momentos de crise. E atualmente nosso projeto, aprovado pela Assembléia, está cifrado em torno de 20 milhões de euros.
Até 2006, quando Navarro foi premiado, nenhum espanhol havia sido eleito MVP da liga ACB. A grande presença de estrangeiros ajuda ou atrapalha o basquete espanhol?
A Federação Espanhola sempre está interessada na formação, no desenvolvimento, no crescimento e o êxito de nossos jogadores. Mas não se pode fechar os olhos à realidade e a realidade indica que com as fronteiras da Europa estão abertas à circulação de jogadores. Nós, em todo momento, nos opusemos aos descumprimentos das normas e das leis, mas, ao mesmo tempo, temos tratado de impulsionar e apadrinhar medidas que equilibrem a situação. Foi a FEB, por exemplo, que propôs à ACB e aos jogadores que aplicassem as atuais cotas de selecionáveis nas equipes.
Mas há diferenças entre elas…
A ACB faz parte da Federação. Seu presidente, Eduardo Portela, é o vice da FEB. A ACB é responsável pela gestão de sua competição, ainda que organizá-la conta com algumas competências que são delegadas à Federação, como a arbitragem, por exemplo. Há ocasiões em que nossas posturas se chocaram, mas em geral, as relações entre ambas as entidades são regidas pelo profissionalismo e os convênios que firmamos de forma regular.
Em recente post no seu blog, comentou sobre a necessidade de ajudar os países de basquete menos desenvolvidos, como os de África e América Latina. Como a FEB pode ajudar o Brasil, que também tem se mostrado um centro de basquete menos desenvolvido?
Nós podemos ajudar a quem quiser que os ajudemos e faremos na medida de nossas possibilidades. Se a Confederação Brasileira considera que nossa experiência pode ser útil e nos chamar, claro que vamos abrir todas as vias de colaboração possíveis. Mas isso sim, sabendo que não há receitas mágicas senão a necessidade de trabalhar, trabalhar e trabalhar.
Nosso treinador é espanhol, Moncho Monsalve. O que nos diz sobre ele? E sobre a formação, em geral, de treinadores na Espanha.
Moncho Monsalve é, para o basquete espanhol, uma verdadeira referência. Tanto pelo seu extraordinário nível profissional como por sua entrega incondicional ao nosso esporte, seja como treinador no banco de uma equipe ou seja como professor em nossos Cursos. Na Federação sempre escutamos e valorizamos a opinião de Moncho porque há poucos homens no basquete tão versáteis como ele. Monsalve é um valor, um ativo do basquete espanhol. E sobre a formação de treinadores, me remeto a esses cursos de treinadores em todos os níveis que anualmente a FEB oferece, bem como outras ferramentas que nos últimos anos temos colocado a serviço de todos os treinadores, como o Clube do Treinador, aproveitando as possibilidades que a nova tecnologia oferece. Acreditamos que um treinador não se forma apenas em um curso, mas sim que sua formação é contínua e tentamos fazer chegar a eles todas as ferramentas que estiverem ao nosso alcance.
Quando começou esse grande projeto de desenvolvimento do basquete espanhol? Tem alguma data que a gente pode marcar como fundamental?
Na história recente do basquete espanhol há duas datas que podem ser consideradas determinantes. Uma delas é 1984, o ano em que a seleção conseguiu um resultado que parecia pouco menos que inatingível, como a medalha de prata nos Jogos Olímpicos. Alguns meses antes havia nascido a Liga ACB, que teve também um importante efeito, mas aquele êxito da seleção fez que o basquete alcançasse um protagonismo social impressionante que levou ainda os jovens a praticar nosso esporte em muito maior medida que antes. Ao te dizer que naqueles anos o basquete quase se igualou ao futebol em popularidade, já te digo tudo sobre a época. A segunda data é menos concreta, mas se trata, logicamente, da erupção dos nossos atuais jogadores internacionalmente reconhecidos – muitos deles já estrelas na NBA e que em 1999 se proclamaram campeões do mundo júnior. Naquele mesmo ano, a seleção adulta foi vice-campeã Européia e tudo isso voltou a levar o basquete ao nível máximo de popularidade.
Aqui, nesse tempo em que a Espanha cresceu tanto, Brasil apenas diminuiu. Desde 96 não conseguimos levar a seleção masculina às Olimpíadas, mesmo com jogadores talentosos… Saberia dizer o que é possível fazer para melhorar?
No que se diz respeito à seleção, não basta apenas ter jogadores com muito talento: o principal é compromisso. Se se falha no compromisso, se falha em quase tudo e, sobretudo, no seu reflexo social.
Qual o motivo da diferença do crescimento para o basquete feminino e masculino na Espanha?
Não é bem assim. O que acontece é que os êxitos da seleção masculina têm muito mais impacto na mídia. Mas nossas garotas conseguiram medalhas em quatro europeus consecutivos, e nos últimos jogos olímpicos acabaram em quinto lugar, o melhor posto da História. As seleções femininas de categorias inferiores também estão no máximo nível internacional e nossos clubes de ponta também o são na Europa. Os resultados de nossas meninas são, ao todo, equiparáveis aos dos meninos.
O Brasil acaba por passar por uma eleição que elegeu um novo presidente e gente da equipe dele diz que sempre lêem nosso site. Pode deixar alguma mensagem sobre o intercâmbio para a possibilidade de desenvolvimento do nosso basquete?
Como eu disse antes, nossa Federação está sempre aberta à colaboração e ao diálogo, porque é algo que enriquece a todos. Se os máximos dirigentes do basquete brasileiro crêem que podemos ajudar, saibam que têm as portas abertas do basquete espanhol.
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Veja também outras entrevistas clássicas do nosso site, como a de Carlos Delfino e Juan Carlos Navarro. Para o arquivos de entrevistas, clique aqui.
Fotos: Fiba Europe e El País
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Entrevista e tradução de Guilherme Tadeu de Paula, editor do Draft Brasil (guilhermetadeudepaula@gmail.com)