Lições de Sunchales
Já foi mais do que debatido aqui o fato de que duas equipes brasileiras, Flamengo/RJ e Universo/Brasília, abriram mão do direito de sediar o Grupo C da Liga das Américas de Basquete, ambas alegando dificuldades financeiras.
Isto porque as equipes anfitriãs ficariam responsáveis pelos custos com translado, refeição e hospedagem de árbitros e jogadores das demais equipes.
Na prática, para as equipes brasileiras, significaria pagar hotel e passagem para 1 delegação nacional e 2 delegações sul-americanas (uma do Chile e outra da Argentina).
Assim, a crise financeira acabou mesmo sendo o grande bode expiatório para o Brasil não sediar nenhum dos grupos da fase de classificação do torneio.
Resta saber, entretanto, como Sunchales teve a capacidade de fazer o que a capital federal e a segunda maior cidade do Brasil não conseguiram.
Para começar, soa estranho que a Argentina, país que sofre impacto ainda maior que o Brasil com a crise financeira mundial possa se dar o “luxo” de sediar 2 Grupos da Liga das Américas (Mar del Plata sediou o Grupo B).
Mas isso não é nada. Consumada a desistência das equipes brasileiras, Sunchales precisou disputar com outras duas cidades argentinas o direito de sediar o Grupo C da Liga das Américas. Santa Fé (capital) e a província de Formosa também postularam aquilo que os brasileiros dispensaram.
Sunchales acabou levando vantagem sobre as concorrentes em virtude de ser a casa de um dos representantes do Grupo C, o Libertad Sunchales.
Engana-se, contudo, quem imagina ser Sunchales uma grande metrópole como Buenos Aires. Muito pelo contrário, na verdade, os argentinos brincam que Sunchales “não existe”, de tão pequena.
A cidade agroindustrial possui uma população de cerca de 18 mil habitantes, segundo o censo realizado em 2001.
Mas afinal, como Sunchales conseguiu arcar com “tantos custos” e sediar o Grupo C da Liga das Américas?
Para começar, os dirigentes do Libertad Sunchales negociaram com a FIBA, conseguindo convencer a entidade a abrir mão do direito referente à publicidade estática no ginásio (placas e quadra), conforme afirmou Enso Olocco, presidente do clube ao jornal Sunchales Hoy.
Apenas com a venda desses espaços publicitários, o Libertad Sunchales conseguiu bancar todas as despesas do evento.
Como na Argentina atualmente não se “brinca” de organizar basquete, o torneio vem contando com ampla divulgação na imprensa local, o que atrai o público e costuma possibilitar a cobrança de preços não tão modestos pelos ingressos que, no fim das contas, poderá gerar algum lucro para o Libertad Sunchales.
Em tempo, o ginásio da equipe possui capacidade para 4.200 torcedores e o preço dos ingressos varia aproximadamente de R$ 13,00, os mais baratos, incluindo promoção para quem é “sócio torcedor” na liga nacional da Argentina, a R$ 53,00, os mais caros.
Mas essa não é a única forma de o Libertad Sunchales gerar renda. Já há algum tempo, quem comparece aos jogos pode comprar produtos da equipe, inclusive, a sua camiseta oficial. Algo extremamente raro nos ginásios brasileiros. Aliás, ganha um prêmio quem conseguir comprar uma camiseta oficial de basquete do Flamengo ou do Universo/BRB.
Por essas e outras que é incompreensível que as equipes brasileiras sejam incapazes de organizar um torneio continental tão importante e relativamente barato. Enquanto os dirigentes daqui choram as mágoas da crise, os argentinos se movem para contorná-la. Resta saber o que nos aguarda na nova liga nacional, o NBB.
Foto: Recreação promovida pela Prefeitura de Sunchales