Novo tempo de otimismo, por Prof. José Marinho
Quem poderia imaginar que o Brasil estivesse classificado para o Mundial, vencendo todos seus oponentes (perdemos o jogo que podíamos, pela diferença necessária) e, ainda, derrotando Porto Rico por um ponto na final. Logo Porto Rico, adversário do qual somos fregueses de caderninho (0 x 6 nas últimas competições relevantes). Em outra época recente, aquele arremesso de três do Arroyo seria guiado pelos maus fluidos direto para nossa cesta. Ou melhor, já estaríamos perdendode 20 pontos, alguém teria se recusado a entrar em quadra, outro teria voltado mais cedo ao Brasil e estaria detonando o técnico e os companheiros e os dirigentes diriam que estava tudo dentro do planejado, que o treinador estava mantido pelo bom trabalho e seria demitido na semana seguinte.
Ouvi as críticas mais diversas sobre a nossa seleção: a falta de um armador reserva, jogamos apenas com sete, não temos pivôs reservas, o baixo nível da competição, etc. Amigos, o objetivo imediato era classificar nossa equipe para o Mundial e nós fomos os primeiros a alcançá-lo. Temos um ano para avaliar e atender às reivindicações, se for procedente, dos pessimistas de plantão, que já preconizam o fracasso no Mundial de 2010. As nuvens escuras do passado recente já ficaram para trás. Vamos renovar os ares…
Impossível não destacar o sistema defensivo brasileiro. Isto mesmo, nossa defesa!!! Mudamos da água para o vinho no equilíbrio defensivo, dedicação, postura e, principalmente, nos conceitos. Aprendemos a defender bons arremessadores, antecipamos com eficiência o “pick and roll”, saímos bem dos bloqueios indiretos e executamos de maneira bastante satisfatória as rotações. Em suma, a maioria das tarefas defensivas foram efetuadas com eficiência, isto sem contar com o bom nível do rebote defensivo.
Desempenho das Equipes Adversárias do Brasil na Copa América
Equipes | Pontos | %Arrem | Dif-Reb |
Rep. Dominicana | 68 | 40,6 | -11 |
Venezuela | 67 | 41,9 | -13 |
Argentina | 67 | 41,3 | -4 |
Panamá | 64 | 38,3 | -3 |
México | 61 | 39,3 | -6 |
Canadá | 59 | 37,1 | +3 |
Uruguai | 62 | 33,3 | -9 |
Porto Rico | 82 | 49,1 | – |
Canadá | 65 | 39,3 | – |
Porto Rico | 60 | 35,8 | +7 |
Nosso jogo ofensivo também evoluiu. Os arremessos irresponsáveis e a pouca continuidade dos movimentos parecem pertencer ao passado. O duro jogo contra o Canadá na fase de classificação (nossos movimentos já estavam bem estudados pelo adversário) demonstrou que a qualidade do esquema de ataque esbarrou na carência técnica de nossos jogadores. Faltam bons infiltradores, especialistas de três pontos e pivôs mais versáteis. Neste nível, o poderio técnico do atleta é capaz, inclusive, de ser mais importante que as mais bem elaboradas ações ofensivas.
O técnico Moncho utilizou, na maior parte do tempo da competição, apenas sete jogadores. Precisamos analisar este comportamento sobre alguns aspectos. Na fase de preparação, perdemos Baby, Manteiguinha, Murilo e Paulão pelos mais diversos motivos. Não tenho dúvidas que eles estariam na rotação caso continuassem com o time. Um armador mais novo, talvez, pudesse ter sido convocado (Vitor Benite, por exemplo), pensando no futuro. Além disto, o basquete brasileiro não é um celeiro de craques como alguns insistem. Existe uma grande carência de talentos. Nossos bons jogadores apresentam deficiências físicas e técnicas. Apresentem-me um jogador além do Lenadrinho capaz de criar com o drible? Apontem-me um armador com bom porte físico capaz de fazer leitura de jogo? Qual de nossos pivôs tem um arremesso de três pontos confiável? Falta motivação profissional pela desestruturação dos clubes e pela ausência de um plano de carreira. Falta qualidade de trabalho na base. Falta capacitação do corpo técnico. Faltam estratégias para descobrimento e desenvolvimento de atletas (basquete escolar, por exemplo). E faltava uma competição que servisse de espelho. Este problema caminha para uma solução com a NBB. Os “sete do Moncho” servem como um momento de reflexão sobre a dinâmica de nosso basquete na atualidade.
Não me venham com esta historia de baixo nível técnico da competição. No Pré-Olímpico de 2007, perdemos para a Argentina (os mesmos jogadores e o Delfino) e para equipe olímpica de Porto Rico (de 22 pontos!!!). Além disto, a Seleção Dominicana veio para a Copa América com sua força máxima (exceto o Ariza) e nem se classificou. Só para se ter uma idéia, a primeira rodada do Eurobasket 2009 apresentou a média de 73 pontos por jogo. Será que lá o basquete também está tão deficiente? Precisamos perder o ranço causado por tanto sofrimento e derrotas, passando a valorizar as nossas conquistas. Principalmente esta, obtida por um grupo que demonstrou dignidade e compromisso.
Por fim, preciso ser coerente com que sempre escrevi. Preconizei a mudança total de todas as comissões técnicas ligadas à antiga direção da CBB. Nunca duvidei da competência do Moncho, embora achasse que a Confederação necessitava de uma faxina total. O presidente Carlos Nunes optou pela continuidade do trabalho técnico, acreditando que o respaldo extra-quadra que faltou às campanhas anteriores de nossa seleção seria suficiente para que atingíssemos a classificação para o Mundial. Ele estava certo. Tão certo que o lugar no Mundial veio recheado com o título da Copa América. Espero que esta brilhante conquista melhore nossa auto-estima, incuta um pouco de otimismo em todos e sirva como fonte de inspiração para novas iniciativas no soerguimento de nosso basquetebol.
Prof. José Marinho é mestre em Educação Física pela UFRJ, já foi colunista do Lance! e é responsável pelo site www.bbheart.com.br. Desde 2007 é colaborador do DraftBrasil.