O rótulo eterno de uma estrela, por Thiago Arantes
Eu detesto esses programas que ficam mostrando coisinhas para aumentar a qualidade de vida, a organização e todas as coisas que eu não tenho. Outro dia, uma mulher estava ensinando a separar os temperos usados em cozinha, para facilitar o uso. A ideia óbvia genial era colar adesivos em potes de vidro: sal, açúcar, pimenta, orégano.
Eu jamais farei isso, e o motivo vai além de minha desorganização, um dos meus orgulhos secretos: e se um dia eu quiser usar o pote do açúcar para colocar, sei lá, sal grosso? Eu nunca vou conseguir olhar para aquele sal grosso da mesma forma. Sempre vou olhar, ler ‘açúcar’ e pensar ‘porra, que açúcar escroto’ ’tem algo errado com esse açúcar’. Por isso, na minha casa, o açúcar sempre ficará no saquinho em que foi comprado, o sal e o orégano também. E que se dane o armário, que fica todo sujo.
Mas, indo ao que interessa – ninguém entrou aqui pra pegar receita, espero. O esporte não é tão bonzinho quanto eu. Nele, depois de um certo, às vezes nem tanto tempo assim, torcedores, jornalistas, jogadores, todo mundo, coloca os atletas em um pote de vidro e tasca logo uma etiqueta.
LeBron James tem 26 anos e está em sua oitava temporada na NBA. Nas sete anteriores, levou um time de merda limitado a ser um dos melhores da liga. Na oitava, está na final. Mas ele não pode ser vice, simplesmente porque não tem o direito de errar. E saber lidar com isso é que separa os grandes dos maiores.
LeBron está condenado. Condenado porque ele é bom demais, e se não fosse ninguém cobraria tanto assim. Mas quem é bom demais não tem o direito de errar. Na terça-feira, ele fez o pior jogo da vida dele: 8 pontos, 9 rebotes, 7 assistências. Repito, isso é o PIOR jogo da vida dele. Se um Leandrinho da vida faz isso, a manchete no outro dia será ‘Leandrinho flerta com triple-double’.
(Cabe a explicação: triple-double é quando o cara consegue dois dígitos – dez ou mais – em três estatísticas. Geralmente pontos, rebotes e assistências, mas tocos e roubadas de bola também entram na conta).
Na quinta-feira, LeBron fez 17 pontos, 10 rebotes e 10 assistências. Triple-double. Um triple-double em uma série final de NBA! Sabe quanta vezes Michael Jordan conseguiu isso? NENHUMA.
Mas LeBron fez só dois pontos no último quarto. No jogo anterior, passou em branco nos minutos decisivos. Para Lebron, jogar bem nunca será o suficiente. Ele está preso dentro de um pote que parece não ter saída. E, embora seja prematuro dizer isso, creio que não sairá jamais.
Suponhamos que LeBron acorde, faça mais triple-doubles, faça 60 50 40 pontos em cada um dos jogos que restam e o Miami Heat vença o Dallas Mavericks. Aí vão dizer que ele só foi campeão porque estava ao lado de outros craques, como Dwyane Wade e Chris Bosh, que bom mesmo ele seria se fosse campeão no Cleveland jogando com Mo Williams e Anderson Varejão.
E se um dia LeBron voltar ao Cleveland, ou for jogar no Golden State, ou no Sacramento, no Los Angeles Clippers. Se um dia, aos 39 anos, ele liderar uma campanha de título com 75 vitórias na temporada regular, com média de triple-double e fizer 4 a 0 na final da NBA, não vai adiantar.
Vão dizer ‘Pô, o cara só foi ganhar o primero título agora? Poderia ter ganho antes se não tivesse amarelado’.
LeBron pode se tornar um dos maiores da história.
Mas nunca sairá de dentro do pote.
—
Thiago Arantes, é um amigo e colaborador do DraftBrasil. Já cobriu de Copa do Mundo a mesa de pôquer e está sempre criticando e conversando no seu Boteco do Arantes e como ele mesmo diz, sente por lá e entre na conversa também.