Passeando pelo Interior, por Prof. Paulo Murilo

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Publicado em: 19/02/2008

Prof. Paulo Murilo

Por: Prof. Paulo Murilo

“Essa é para os pessimistas, técnicos ou mesmo analistas que teimam em proclamar a decadência do basquete brasileiro. Que venham até aqui em Franca para constatarem a pujança do nosso basquete. Que dêem uma volta no interior de São Paulo, Baurú, São Bernardo, São Caetano, Piracicaba, Assis, Araraquara, para verem a renovação do nosso basquete, que está mais vivo do que nunca”.

Com esse preâmbulo ufanista o comentarista da ESPN Brasil iniciou seus trabalhos no primeiro jogo da decisão do Campeonato Paulista, em Franca. Só sinto a sua não menção de outros centros tão ou mais importantes do que São Paulo, principalmente em sua época de grandíssímo jogador que foi, como o Rio de Janeiro, hoje relegado a um basquete de aluguel de camisas, Belo Horizonte com seu clube de uma nota só, como o sul do país outrora recheado de participantes, e hoje relegado a uma ínfima parte do que foi, servindo de mercado a jogadores não aproveitados por seu megalópico estado. E por que não mencionar o nordeste, com sua tradição rompida de sempre apresentar bons valores, assim como o centro-oeste, onde nem a grande capital do país consegue se impor em massa praticante, sobrevivendo de uma equipe que se manterá enquanto o senador zero voto a mantiver por capricho e interesses comerciais. Por que então não mencionar o óbvio? O de que a injeção de verbas privadas e de prefeituras no estado mais rico da nação é a razão de tal sucesso, que diga-se de passagem, já foi bem maior num passado recente? De mencionar em termos finais e justos de que São Paulo faz parte de um país onde educação e esporte não andam de mãos juntas como deveria ser, ao se testemunhar auditivamente os coros de “juiz vai tomar no…” e “ juiz filho da…” entoados por pais de família e seus filhos no ginásio da auto-proclamada capital do basquete brasileiro, para espanto do restante da população tele-ouvinte dos demais e olvidados estados, fatores menores e destituidos da importância capital representada pela pujança paulista ? Convenhamos peclaro comentarista, não soam bem tais colocações, ainda mais se tratando de um professor de tão alto e reconhecido gabarito.

Mas tais declarações nos remete a uma outra constatação, e essa sim, é de transcendental importância para o futuro do grande jogo entre nós, a realização da Copa de São Paulo, atração elevada à quinta potência pelo comentarista, incluindo uma sutil menção de que se a CBB não age em função da melhoria do basquete , a Associação de Clubes de Basquete, fundada pelos mesmos clubes que fundaram e depois traíram a NLB, estabeleceria os novos rumos a serem tomados, basicamente por São Paulo, que recentemente reconduziu o presidente de sua federação para mais um período de comando, exatamente pelo apoio dado a essa Copa. Mas não podemos esquecer que esse mesmo dirigente estabelecerá um dos votos de maior peso na próxima eleição para a presidência de CBB, onde até bem pouco tempo acumulava uma Vice-Presidência de Relações Internacionais, da qual se resignou teatralmente por divergências irreconciliáveis com o grego melhor que um presente.

Então, ficam e pairam no ar duas incógnitas, daquelas bem felpudas, que somente felpudas e matreiras raposas serão capazes de equacionar. A primeira diz respeito às convocações para as seleções brasileiras, para aqueles jogadores que não participarem do Campeonato Nacional, mas participarão da fortíssima Copa de SP. Lembremo-nos dos preteridos jogadores que atuavam na NLB, um dos quais, vivamente se transferiu para uma das equipes do Campeonato Nacional, gerido pela CBB, e que por causa dessa atitude foi relacionado para o Pré-Olímpico de triste memória. Como reagirá a FPB ante a possibilidade já posta em ação anteriormente? Ou existirá um acordo de cavalheiros irreconciliáveis para dirimir tal dúvida, numa ação de raposas premiadas?

A outra, mencionada acima, o voto paulista, que com sua força inquestionável, arrastará outros estados menos votados, mas sempre prontos a usufruírem as benesses advindas dos mesmos, conotando uma forte possibilidade de quebra no continuísmo diretivo cebebiano, mas que poderá estar atrelado a interesses quase nunca clarificados aos não iniciados nos mistérios que envolvem o desporto nacional ? A derrocada carioca nas últimas eleições, mais a continuidade da direção capixaba, somada a de São Paulo, pulverizou o perigo ensaiado pelos nove votos contrários na última eleição na CBB, tornando menos árido o caminho para a recondução, e conseqüente continuismo da política atual, absurda e irresponsável.

Qual a influência que verdadeiramente será exercida pela Copa de São Paulo dentro das perspectivas que ouso mencionar, e lembrar, para o soerguimento do basquete brasileiro? Qual relação entre CBB e Federação de Clubes será desencadeada na confrontação de campeonatos, que outrora derrotou a NLB ?

Acredito que enquanto o poder dos estados, e seus votos mágicos e poderosos, coexistirem ligados aos interesses de uma elite de raposas de alta estirpe, nosso bom comentarista, excelente professor e extraordinário ex-jogador, poderia propor que não só visitássemos o interior de seu estado na constatação de seu poderio, como incentivasse a todos para também passearem pelos demais estados, quando muito para, ao conhecê-los, estabelecerem a verdadeira compreensão de que não basta somente um deles ser a potência que é, sem o soerguimento dos demais. A revolução de 30 já deveria ter ensinado que separatismo não leva a lugar nenhum, mesmo na concordância e reconhecimento do poderio de seu estado, belo estado, natal.

O jogo foi excelente, com Franca demonstrando o poder de atuar com dois armadores de qualidade, e agora, maravilha, jogando fora do perímetro, estirpando aquelas maratonas que os obrigavam a perderem o foco das jogadas em estéreis bloqueios dentro e nos limites finais do mesmo, num auxilio permanente de armação, equilíbrio defensivo e acionamento efetivo dos homens altos jogando mais próximos aos rebotes. Aos pouco novas soluções ofensivas se farão presentes, eliminando também aos poucos os ridículos e engessados chifres, punhos, polegares, e outras bobagens afins, propiciando a aposentadoria mais do que tardia do terrível e constrangedor monólogo da prancheta, assim como microfones de lapela. Fica faltando a negativa de que microfones sejam empurrados goela abaixo dos técnicos naqueles momentos em que a privacidade se torna fundamental para o entendimento e acerto das ações dentro da quadra. Seria o mesmo que qualquer técnico se apossasse do microfone de um analista e comentarista para retirar do mesmo a oportunidade de exercer seu trabalho, sem interferências e sem despropositados palpites.

Estou curioso para testemunhar o desenrolar do que vem por aí, na forma bem ou mal acabada de uma Copa, e suas boas ou más conseqüências para o basquetebol, não só aquele bem jogado em São Paulo, mais o de todo o país.

Amém.

Paulo Murilo é professor da UFRJ (aposentado), técnico atuante de Basquetebol, Doutor em Ciências do Desporto -FMH-Lisboa. Bacharel em Jornalismo Audiovisual pela ECO-UFRJ. Posta regularmente em seu blog, http://paulomurilo.blogspot.com/ e é um colaborador do DraftBrasil.

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