Por que Memphis perdeu? – Por prof. José Marinho
Toda vez que surge algum conceito novo de jogo é como se o basquete rejuvenescesse, ganhasse mais vida, provasse para todos que o antídoto para a mesmice está na criatividade, na busca de algo original.
O padrão tático da Iugoslávia de Petrovic e Kukoc em 1990, os Lakers de Magic e cia com seu estilo “showtime”, os conceitos de jogo da nova Argentina e até mesmo o Brasil de Oscar e Marcel, que demonstraram para o mundo a importância do arremesso de três pontos, foram exemplos de posturas originais, que não somente quebraram paradigmas, mas também propiciaram reflexões sobre o infindável número de opções táticas existentes neste maravilhoso esporte. Só não me peçam para incluir a tal “estratégia dos triângulos”. Com MJ, poderia ser quadrado, losango, cateto, hipotenusa, que tudo daria certo…
Não ouso incluir o Memphis de John Calipari neste rol de grandes equipes. Mas que neste Final Four pudemos observar algo diferente, com certeza sim. O estilo de jogo livre (quase “streetball”), baseado em muita movimentação e no 1×1, aliado à qualidade e à condição atlética de alguns de seus jogadores, empolgou a qualquer um que assista o basquete com mais atenção. Chris Douglas-Roberts, Derrick Rose e cia demonstraram habilidade com a bola e um ”first step” desconcertantes.
Isto sem contar com o jogo de transição em alta velocidade e de muitos roubos de bola decorrentes de interessantes situações de rotação defensiva.
Ok. Apesar de tudo que foi dito sobre o Memphis, o campeão acabou sendo Kansas. Por que? Tentarei nas próximas linhas desvendar este mistério.
Camisa. Faltou camisa, tradição. A melhor colocação dos Tigers na NCAA foi um longínquo vice-campeonato em 73, enquanto Kansas tem agora três títulos. A fisionomia de “pavor” dos reservas de Memphis com a perspectiva de vencer fala por si só.
Lances livres. Este fundamento foi o fantasma de Memphis na competição. Apenas 61% de acerto total, sendo que Joey Dorsey ostenta pífios 38%. No jogo foram sete erros em 19, sendo quatro deles em cinco no minuto final do tempo normal. Kansas errou no jogo todo apenas um em 15 tentados.
Jogo interior. Vem a tona novamente Joey Dorsey. Na semifinal contra UCLA, o pivosão teve um desempenho, no mínimo, esdrúxulo: 0 pontos, 15 rebotes! A falta do jogo interior poupa o adversário de faltas e cria problemas de espaço para os jogadores externos.
Artilharia de três pontos. Os jogadores de Memphis se sentem muito confortáveis nas infiltrações e nos arremessos de meia distância. Falta um arremessador puro de três pontos. Douglas-Roberts é o único com percentual superior a 40%. Não dá para ele fazer tudo!
Banco. 15 x 2 em pontos. 59 x 31 em minutos. 15 x 6 em arremessos tentados. Os reservas de Kansas contribuíram mais, não só dando mais refresco aos titulares, mas também em qualidade de jogo. Numas das bolas decisivas do jogo, faltando três minutos e com nove pontos de desvantagem, foi o suplente Sherron Collins quem acertou um arremesso três pontos logo após uma roubada de bola.
Os dez últimos segundos. Rose parece ter sido instruído a fazer falta no armador adversário. E a meu ver, fez falta. Mas o arbitro não marcou e surgiu a oportunidade do arremesso de três pontos que levou o jogo ao tempo suplementar.
A defesa aos bloqueios em série. A jogada base de Kansas (muito interessante, por sinal) prevê um bloqueio direto e um indireto em seqüência. Memphis se saiu muito bem durante quase toda a partida, exceto na prorrogação. Reclamar da defesa de Memphis pode não parecer justo. Talvez deva se atribuir o erro à queda no moral da equipe.
Abuso nos dribles. A base do ataque de Memphis está no desequilíbrio criado no 1 x 1. Porém, nos contra-ataques, muitas vezes alguns jogadores optaram pelo drible mesmo tendo companheiros mais bem colocados na frente, desperdiçando assim a chance de uma cesta mais fácil.
Falta de sorte. Nada tenho a dizer sobre isto. Simplesmente, acontece.
Mas por que perdeu afinal? Detalhes. O basquete é um jogo de detalhes. O somatório de pequenos errinhos pode acarretar a diferença entre o céu e o inferno. Memphis cometeu pequenas falhas no momento errado e foi punido exemplarmente pelos “deuses do basquete” com a derrota. E a história será madrasta com os Tigers, reservando destaque ao Kansas como campeão da temporada e o quase ostracismo para os vencidos. Eu, pelo menos, lembrarei com carinho do Memphis. Pelo imprevisível, pelo criativo, pelo novo, pelo diferente. Viva a diferença!