Texto sensacional do Rodrigo Alves do blog rebote do GE e que acompanha esse time há bastante tempo. Vale a pena ler tudo:
Se ontem conversamos sobre Franca, vamos hoje falar do Flamengo, que após avançar à final nos últimos três anos, desta vez vai ver a decisão pela TV. Sobre a confusão no fim do jogo 3, acho que tudo já foi dito, né. Minha opinião ainda é a mesma: não vejo nada demais no drible do Penna e acho que o Marcelinho reagiu muito mal – não só deveria ter sido expulso como merece ser punido pelo tribunal. Mas os problemas do Fla neste ano vão muito além de um momento de destempero do seu principal jogador. Vamos montar a lista?
1) Uma filosofia empacada no meio do caminho.
A troca de técnico no meio da temporada tinha tudo para ser um combustível rumo a outro título. Chupeta não tinha mesmo clima, era preciso mexer, e a opção por Gonzalo García parecia uma boa aposta. Ainda acho que Gonzalo veio cheio de boas intenções e teve bons momentos. Em algumas partidas, fez o time jogar mais com os pivôs, Bábby subiu muito de produção, e Teague caminhava para ser o coadjuvante perfeito para Marcelinho. Mas tanto o pivozão quanto o americano se machucaram, e aí o castelo desabou. Gonzalo não conseguiu mais dar um padrão à equipe e ficou em cima do muro, entre o “sem freio” de Chupeta e o basquete cerebral argentino. Não fez uma coisa nem outra e, enquanto o elenco tinha muita dificuldade para absorver a nova filosofia, o time ficou frágil. Perdeu jogos importantes, sofreu um golpe na confiança, e as coisas pararam de funcionar.
2) Alguns atletas despencaram tecnicamente.
Marcelinho não entra nessa estatística, porque continuou jogando bem, mas viu sua média de minutos por partida cair um pouco e o mesmo aconteceu com os outros números. Talvez as duas quedas mais vertiginosas tenham sido de Hélio, que atravessou uma temporada ruim, e principalmente Duda, que esteve pior até do que os seus tímidos números sugerem. Eu fui a praticamente todos os jogos do Flamengo aqui no Rio, e quem frequentou os ginásios ao longo do ano sabe que Duda prejudicou o time em diversas ocasiões, seja na Sul-Americana ou no NBB, com decisões erradas que não aparecem nas estatísticas. Ainda assim, fui buscar uns dados comparando o rendimento de Marcelinho, Duda e Hélio na campanha vitoriosa de 2009 e agora em 2011. Estão no quadro ali abaixo, dá uma olhada. Repare que, das 21 comparações, apenas em três a produção melhorou (destacadas com as bolinhas). O trio passou a ter uma quantidade um pouco menor de minutos, o que tem impacto na estatística, mas o fato é que eles foram fundamentais no título há dois anos e agora contribuíram menos (sendo que Marcelinho ainda hoje é fundamental, enquanto os outros dois puxaram o time para baixo).
3) A compensação dessa queda não funcionou.
Se um trio tão importante produziu menos, era preciso arrancar mais de outros lugares. E isso não aconteceu. Bábby e Teague, como já falei, oscilaram por causa das lesões; Jefferson e Fred, coadjuvantes importantes em 2009, também caíram; Wagner tem limitações ofensivas e chega a ser covarde a cobrança da torcida em cima dele; Átila e Guto não renderam o esperado, principalmente o primeiro, que chegou como esperança para desafogar Bábby; e resta Guilherme Teichmann, que na minha opinião foi o único a dar um gás no time ao longo da temporada – fez de tudo um pouco, mas também não é um milagreiro salvador da pátria.
4) O clima no vestiário não era dos melhores.
Como se não bastassem todos esses problemas, o dia a dia não era de extrema leveza. Começou com o desgaste do grupo com Chupeta, e depois ainda teve o episódio Bábby x Hélio, que segundo reportagem do jornal Extra (depois confirmei com pelo menos duas fontes) não se davam bem por causa da rixa entre suas esposas. É claro que isso influencia na quadra.
5) A diretoria também cometeu seus vacilos.
O caso Lamonte, por exemplo, foi uma vergonha. O americano foi contratado e sequer chegou a jogar, pediu o boné antes de pisar na quadra. A questão dos ginásios também pesou contra. O Flamengo mandou jogos em três quadras diferentes no Rio, sendo que na melhor delas (a HSBC Arena) o clube foi incapaz de criar mecanismos para atrair um mínimo de torcida. Não estou dizendo que dá para colocar 5 mil na Arena numa sexta à noite, mas se houvesse mais divulgação, ações de marketing, promoções, ingressos mais baratos, dava ao menos para evitar vexames como o dos 17 pagantes contra Araraquara. Está aí um desafio para a diretoria resolver. E é bom planejar isso desde já, né.
Além disso tudo, os adversários cresceram, isso é inegável. Hoje times como Franca, Pinheiros e Bauru são bem melhores do que eram há dois anos, sem falar no Brasília, que foi buscar um Guilherme Giovannoni no ano passado, e Uberlândia, que voltou ao cenário nacional com um elenco bastante competitivo.
A República
Aliás, depois de escrever tanto, era justamente nesse ponto que eu queria chegar. Porque se os adversários cresceram, o Flamengo se manteve estagnado em sua república. Franca vai buscar um Dedé, um Penna, um Benite, um Drudi, um Ricardo. O Pinheiros pega um Shamell, um André, um Fiorotto, um Morro. Só para citar exemplos de jogadores que já estavam no cenário nacional, não precisam de adaptação e são peças contratadas para resolver problemas específicos. No Flamengo, com raríssimas exceções, os reforços são nomes “da galera”, como Guto e Dedé (o veterano), ou nomes “alienígenas” (porque vêm de fora do cenário nacional do basquete), como Teague, Átila, Vitor Boccardo, o malsucedido Lamonte etc.
Isso acontece porque o time funciona como uma república fechada, na qual Marcelinho tem grande influência nas decisões e há um histórico recente de um comando sem pulso para se impor tanto na tática como na disciplina. Dois exemplos rápidos para ilustrar: 1) Chupeta já não tinha comando tático sobre o elenco e Gonzalo tampouco conseguiu impor seus conceitos; 2) Se Marcelinho por acaso é expulso e não quer sair da quadra (como naquele triste episódio de Joinville), não há na comissão técnica quem o faça sair. São só dois exemplos bobos para mostrar que, na República do Flamengo, as coisas funcionam de modo peculiar.
Enquanto estava funcionando, passou. Agora que deu errado, com uma temporada decepcionante tanto no NBB como nos torneios continentais, é hora de mudar, de se abrir, de olhar para os seus pares e ver o que está dando certo ao seu redor. Acho que o pensamento tem que ser assim: “Se eu preciso de um armador, não vou trazer aquele cara mais ou menos só porque ele já conhece todo mundo aqui; ou um gringo que está encostado numa segunda divisão qualquer da Europa porque ele não vai me criar problema; vou olhar para o mercado e ver quem é um armador bom que possa ouvir uma proposta”. Pensamento simples, prático e profissional.
De uma forma ou de outra, é fato que o Flamengo precisa se mexer. Em todos os aspectos. Não sei se você concorda, e se não concorda os comentários estão abertos para o debate, como sempre. Então diga aí.
Eh, levando em consideração a parte que destaquei, para ter uma verdadeira reformulação do elenco rubro-negro, o clube vai ter que se desfazer do MarceZICO. Merece respeito. Fez muito pelo Flamengo, comandou a geração mais vitoriosa da história do basquete rubro-negro, mas já está na hora de sair.